Sobre quem escreve e nada diz

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Eis que partilho a minha opinião sobre um assunto com o qual me desafiam há muito.
Não tenho, por norma, o hábito de me expressar quanto a essa temática da qualidade da escrita e dos escritores. Tal temática é, hoje em dia, cada vez mais empolgada pela fúria das redes sociais quando, de um momento para o outro, a dita comunidade virtual, decide que o menino de 12 anos que rabiscou numa parede "Gosto muito de ti, mamã linda" tem um potencial sobre-humano para chegar à alma mais recôndita do leitor. Mas adiante. Que seja. Vamos lá falar.
 
A minha vontade, assim de chofre, é perguntar que raio se passa na cabeça das pessoas e as redes sociais. Há quase um paralelismo entre a realidade virtual e a física, com críticas acesas e sentidas quando um utilizador se sente ofendido perante um determinado assunto, seja ele qual for. Chegamos ao cúmulo de sentir primeiro, calar, para mais tarde exorcizar a cena em frente ao computador.
 
Poderão achar que me estou a desviar do assunto, mas não estou. Porque a vida está, tal como um funil, a estreitar a um ridículo tal que as pessoas se tornaram incapazes de integrar o termo «aceitação» nos cérebros. Não lhes passa pela cabeça alguém não simpatizar com o trabalho do Pedro Chagas Freitas, que é assumidamente o meu caso, porque simplesmente... não lhes passa. Passaria mais depressa um camião de censuras ridículas em cima do meu ego. [E este é o momento do meu silêncio desconfortável.]
 
Sabem porquê que não gosto do trabalho do Pedro Chagas Freitas? Porque li. E é precisamente aí que quero chegar. A vida não nos ensina, maioritariamente, com os erros em que caímos?
Então porquê que não podemos ler merda, também? (Não me estou a referir ao senhor Freitas nem a ninguém em particular).
E há mais. Quem sou eu para dizer que tu estás a ler um livro de merda e eu estou a ler um daqueles clássicos brutais? Só porque dizem que é bom?
Leia a história infantil «O Rei vai nu». Pense um pouco sobre isso.
 
Sim, eu sou daquelas pessoas que dizem que o mais importante é ler. Ler aquilo que seja importante para cada um de nós. Seja Pedro Chagas Freitas, seja Nicholas Sparks, seja Thomas Mann ou John Steinbeck. O mais importante é que cada um encontre num texto, num livro, aquilo que procura e que o ajude a evoluir. Se podemos chamar determinados trabalhos de literatura, ou não, porque não deixar para os entendidos na matéria? Eu deixo.
 
Para mim, o que realmente importa é a expectativa de um livro e sei, também, que o gosto pela leitura é uma jornada longa que se desenvolve, que vai crescendo e amadurecendo. Como a vida.
 
No que aos livros diz respeito, deve permanecer, na minha opinião, a oportunidade. A oportunidade de se deixar surpreender. Aceitem isso. A liberdade de se poder escolher, mesmo que uma suposta merda. Há sempre alguma coisa. A máxima de um livro para uma pessoa. Seja lá ele qual for.
As melhores coisas da vida são, 99% das vezes, as inesperadas.
 
 
Fica a opinião, que nada mais é do que isso, sobre quem escreve e, aparentemente, nada diz. Penso que o problema está, precisamente, na distância entre aquilo que são as opiniões e os gostos para a dramatização e o exagero de quem tem de gostar, forçosamente, do que é bom.
Seja lá o que isso for.
 
Muitos livros. Muitas leituras.


 

 

4 comentários:

Carlos Faria disse...

Um post bem diferente do habitual, efetivamente há pessoas que entram na onda de rebanho que é liderada por certos críticos, publicidade e opinião pública e estranham que haja gente que não entra na mesma onda. Todos têm o direito de desgostar mesmo naquilo que agrada a maioria, até porque no caso dos livros há mesmo quem não leu mas se choca por uma impressão negativa a uma obra da moda mas vinda de alguém que a leu.
Gosto imenso de muitos livros de Saramago, detestei a viagem do elefante, não era o género dele, mais, nos últimos livros dele pareciam-me repetidos e no auge do culto ao escritor que todos admiravam e deixei de o ler... agora já regressei a obras mais antigas em falta e voltei a gostar.
Roth, um génio de sucesso, só li um livro, O complexo de Portnoy, uma das suas "obras-primas", nem consegui chegar ao fim. Talvez ainda volte a este escritor, mas odiei mesmo aquele livro.
Agora irrita-me mesmo a propaganda que vende qualidade de obras quando de facto estas não têm e os últimos tempos a força dos média e das redes sociais tem ampliado muito este mal e a literatura atual em Portugal está cheia de casos desses. Não conheço Pedro Chagas Freitas ;-)

Denise disse...

Olá Carlos!

Este meu texto de opinião, digamos assim, não vai tanto para as propagandas de publicidade dos livros mas sim para as opiniões e gostos pessoais.
Há uma tendência muito grande a generalizar o que é um bom/mau livro e penso que, por aí, não somos ninguém para - na contrapartida com o outro - dizermos que vale muito, pouco ou nada, entende? É nesse sentido e só.
Dou muito valor aquilo que considero boa literatura não deixando, porém, de salvaguardar que outros livros que eu não considero bons, cito Pedro Chagas Freitas como outro qualquer, poderão ser verdadeiras obras-primas para alguém.
Nesse âmbito das publicidades, nem me atrevo a comentar porque é um assunto que considero não dominar minimamente ;)
O ponto que coloca de que de um autor consagrado, há livros que gosta mais e menos, vem precisamente ao encontro do que pretendo transmitir aqui: um livro é sempre uma oportunidade de encontrarmos alguma coisa, boa ou má. Que se dê, então, essa oportunidade com maior aceitação. Esse termo cada vez mais extinto.
Os gostos esses, serão sempre tão pessoais... Sabe o que é melhor? É saber que a literatura é tão vasta, tão grande e tão rica que para os mais ambiciosos, poderão sempre encontrá-la nos melhores lugares. Independentemente de propagandas menos felizes, como diz ;)

Obrigada pelo comentário!
Beijinhos

Patrícia disse...

Concordo contigo.
Obviamente que me interesso sempre pelo que os outros lêem. Adoro falar sobre livros e às vezes, confesso, é difícil não "julgar" os outros pelas suas leituras. Mas nunca insultei ninguém por gostar ou não de um livro. Mas já fui insultada. Já fui insultada por crianças/adolescentes por dizer que "definitivamente não tenho idade para este tipo de livro" e já fui insultada por adultos por dizer "não gostei deste clássico. Às crianças ignoro, os pais que as eduquem, aos adultos tento ignorar e desaparecer-lhes da frente (mesmo que seja em versão virtual) porque não tenho paciência para gente mal-educada.
Apesar de concordar que o mais importante é ler, seja lá o que for, fico um pouco triste quando vejo que não há evolução nas leituras. Acho que o natural é tentarmos ler sempre um pouco melhor, procurar géneros novos, tentar ler autores que antes considerávamos difíceis.
Eu pelo menos sou assim. Hoje olho para trás e há livros que não me vejo reler.
No grupo literário a que pertenço é raro, muito raro, que todos gostemos de um livro. Até é raro que haja algum livro que desperte a atenção de toda a gente. E é essa pluralidade que adoramos, as discussões do "como é possível achares isso??!!" são sempre seguidos de ataques de riso.
Boas leituras

Denise disse...

Olá Patrícia :)

É uma pena que assim seja, mas infelizmente vamos estar sempre sujeitos ao julgamento fácil. O bom é saber que provêm das pessoas pequeninas.
O melhor é ler, sim. A minha ideia passa por isso mesmo, crescer enquanto leitora, num paralelismo daquilo que deveria também ser a própria vida. Que seja uma espécie de "seleção literária", num brinde ao meu tão querido e estimado Charles Darwin (risos). Como já disse ao longo deste texto e comentários, o melhor da literatura é ser vasta (e maravilhosa!), termos muito para conhecer e assim, podermos crescer na medida da nossa própria ambição... :)

Volta sempre e obrigada pelo comentário.
Beijinhos e muitas leituras.

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